A sirene


Aos ouvidos o som fere, incomoda. O movimento se repete: alcança os céus, desenha arcos e de forma brusca, forja, constrói, impõe-se. Sobem tijolos, descem cacos, suor que solidifica e destrói. Tornam-se concretos, completam vazios; acúmulo de sirenes, contas e prazos.
De baixo, o senhor observa. Leva a mão aos olhos, foge à claridade, tudo para entender a movimentação, para enxergar o macacão que ora aparece, ora se afasta.
O andaime ao lado marca o crescimento da obra, torna-se parte da produção, caminho diário rumo à entrega. Hora do almoço, a sirene indica, alívio de alguns minutos.
O capacete marca a experiência. Rubro aos mais novos, descuidados, prestes em colocar em perigo a própria vida e a construção. Nada de quinto andar para eles, cinto, luvas e óculo, tudo para garantir o sossego ao fim do trabalho.
A última olhada na planta, o correr dos olhos no calendário, talvez mais duas semanas.
Água gelada, empresa moderna, padrão de comida, nada de trazer de casa, minutos a menos em esquentar. Cotidiano de vida.
A empresa diz que foi fatalidade. Os amigos, um acidente. A repórter, imprudência.
Não há barulho, não há concreto, não há prazo. Apenas um homem ao lado do maquinário.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Enquanto encontro quatro letras

Sorriso ao sono

Notas do espelho